segunda-feira, 19 de maio de 2008

Another vision of sex

Acabo de assistir a um filme estranho. Não costumo dizer isso sobre quase nada e a conotação aqui não chega a ser negativa. Ganhei o DVD de presente de um amigo americano, o que endossa a hipótese de que a discussão em torno já descambou pro lado mais chato: o do problema de comportamento, o feminismo versus machismo & babaquismos afins.

Cavuquei por aí e só achei em português uma filmografia incompleta da diretora Catherine Breillat - que dirige longas do time "metafísica ou putaria das grossas?", e andou trabalhando com a Asia Argento, em filme que concorreu em Cannes ano passado. Mas as mostras de cinema daqui esse Anatomie de l´enfer/Anatomy of Hell[2004] não deve ter frequentado. Talvez não tenham conseguido enquadrar a produção no circuito de cinema experimental nem no segmento pornô.

Só pra constar, o filme tem atuação do Rocco Siffredi [ele mesmo, minha gente, o ator pornô mais famoso do planeta, que inspirou o nome do filho da Madonna]. O par é formado com a atriz britânica de expressão francesa Amira Casar, de beleza sóbria, descoberta pelo grande Helmut Newton, e que já posou também para Peter Lindbergh e para as inusitadas lentes de Terry Richardson.

Pois bem. Após tentar cortar os pulsos no banheiro de uma boate gay, uma mulher é salva por um homossexual,que depois caminha com ela pela cidade. Faz então uma proposta a ele: todo o dinheiro que ele quiser por quatro noites de observação. Mas o acordo não é tão simples assim. Ele tem que observá-la onde ela é "inobservável". Todos os ângulos, todos os pontos escondidos de seu corpo. "Já que você não gosta de mulheres, poderá ter uma visão imparcial sobre mim".

O que sucede na próxima hora e mais alguns minutos é uma total quebra de padrões morais e convenções estéticas sobre a beleza, o corpo, a genitália, o sexo e o senso comum sobre a pornografia. Uma desconstrução crua [e nua] dos jogos lascivos culturalmente aceitos. Peraí, mas ele não era homossexual? A diretora, em entrevista disponível nos extras do DVD americano, explica diretamente. "Questionar a homossexualidade dele é algo estritamente sociológico. O filme não trata disso, mas sim da origem do mundo. É como se eles fossem o primeiro homem e a primeira mulher confrontando suas naturezas e a diferença absoluta entre os sexos, o que pode ser uma violação assustadora, que eles vivenciam de formas distintas".

Existe uma tentaiva meio rasteira de explorar essas naturezas e atitudes de forma filosófica e metafísica. Isso através dos diálogos, pretensiosos mas irregulares. Tampouco se trata de erotismo - no sentido fantasioso e imaginativo. Além desta outra nudez, o foco está no total ressentimento de um pelo outro, mesmo que os dois personagens tenham sido totalmente desconhecidos até então. Eles aliás, não se tratam por nome [desconhecem a "identidade" do outro], vivenciando ali uma exploração paradoxalmente íntima e impessoal.

Sem meio nem fim a contar, nem mais discussões sobre a validade desse projeto ousado. Os curiosos que procurem aí, pela estrada afora, um torrent para baixar. Só não se deixem levar pelo extremo mau gosto da capa americana com fundo preto e letras garrafais brancas, envolvendo uma cena completamente fora de contexto. O trailer segue aqui embaixo.