quinta-feira, 21 de outubro de 2010

E sempre foi assim com os festivais no Brasil...

Jornal Artes, edição 25, 1971. Texto de Carlos Von Schimidt.

domingo, 10 de outubro de 2010

Gavin Friday


Você conhece Gavin Friday. Mesmo que não se dê conta. Na fria Dublin da década de 1970, Gavin era um punk louco maquiado e vestido de mulher à frente do The Virgin Prunes, um grupo anárquico, performático e enlouquecido no oposto da crueza limpa e meio séria demais do Feedback, que depois virou virou U2. À frente do U2 estava Bono, melhor amigo de Gavin. Na banda de Gavin estavam Dik Evans -- irmão de David Evans, vulgo The Edge -- e Guggi, que emprestou ao U2 seu irmão caçula como modelo das capas de Boy (1980) e War (1983).

Sim, você conhece Gavin Friday. São dele um par de olhos etílicos azuis, uma enorme porção de nicotina vocal e um belo falsetto anasalado. Reconheceu? Existe um Gavin pagão & undergound em Bono, e um Bono de vanguarda art-rock em Gavin. Impossível dizer quem é quem. Após o fim dos Virgin Prunes, em 1986, Gavin limitou-se a pintar, Guggi também seguiu carreira nas artes plásticas e o U2 tornou-se uma das maiores bandas do mundo. Somente em 1989, Gavin voltou repaginado em seu primeiro disco solo, Each Man Kills The Thing He Loves, iniciando parceria duradoura com o arranjador Maurice "The Man" Seezer. No lugar do espírito punk, chegaram os pianos de cabaré, a poesia de Oscar Wilde e uma sofisticada paleta de cores noturnas.

Bono quer a luz, Gavin a penumbra.

Mas quer saber de onde mesmo você conhece Gavin Friday? Da trilha sonora de Em Nome do Pai (Jim Sheridan, 1993), toda composta em parceria com Bono e Maurice Seezer. Com Daniel Day-Lewis no papel de um delinquente irlandês injustamente acusado de terrorismo pelo governo da Inglaterra, o filme conta com a pungente canção-tema You Made Me The Thief Of Your Heart, imortalizada na interpretação de Sinead O'Connor. O PIB da Irlanda deve muito a essa turma. Gavin também está nas trilhas sonoras de Missão Impossível, Basquiat e Moulain Rouge -- outra vez com Bono -- além do hit Angel, da trilha de Romeu + Julieta, sucesso entre o público jovem nos anos 1990.

O que você precisa ouvir são as 12 luxuosas e excêntricas faixas de Adam N' Eve (1992), cheio de climas imprevisíveis, -- produzido pelo Flood, que o U2 tomou mais tarde para a produção de Pop (1998)--; um pouco de Shag Tobaco (1995) e aquela pinceladinha básica pelo trabalho do cara, que é bissexto em matéria de lançamentos.






sexta-feira, 8 de outubro de 2010

New Jersey





No mundo dos frontmen carismáticos, Mick Jagger é Lúcifer, Bono é o Messias, Dave Gahan é Dioniso e Jon Bon Jovi é um anjinho de cera. Jagger excita, Bono hipnotiza, Gahan machuca e Bon Jovi sorri. Com sorriso Colgate. Ininterruptamente. Por 3 horas consecutivas. Animando menininhas entre os 15 e os 50 anos, empolgando alguns marmanjos, fingindo lagriminhas nas manjadas canções de amor noventistas. Sérios indícios bregas, e daí? Eu ali, na arquibancada azul; e o Bon Jovi no país da escova com laquê. Gigantesco no telão, ele, sua calça colada, sua tatuagem de Superman no braço esquerdo.

São trutas. Se comprimentam com aperto de mão entre as músicas. Tudo vai bem. Guitarrista competente, Richie Sambora sola previsivelmente. Tico Torres, modelo tchuby 2010, completava 57 anos naquela noite de 6 de outubro, suando e se matando de tanto bater [a cada pratada, um frio na barriga: "vai infartar, porra!"]. No teclado, um David Bryan discreto como uma ovelha & suas notas pasteurizadamente românticas, com cara de made in Miami. Sem ele, metade do clima vai pro chão. Mas a plateia nem tchuns. Todos estão envelhecidos, menos Jon, que vive no formol. Ele empunha um violão, depois guitarra, e até sola de vez em quando.

Num palco em que Jagger grita, Bono mia e Gahan sussurra, Jon Bon Jovi geme. E rebola. Faz biquinho. Bota a mão no peito. Faz que sofre. E depois sorri. Sorriso Colgate. A mulherada grita. E depois chora pra valer. Uma delas só de sutiã. A outra taca um pedaço da roupa no palco. Jon Bon Jovi pisca. E depois vira. A bundinha faz a festa no telão. E o estádio todo canta You Give Love a Bad Name [num dos raros momentos saltitantes do show], depois Always e These Days, tudo igualzinho ao que a gente ouvia no CD, voltando da escola. Jon no pôster da Bizz pendurado na porta. Jon de todos os tamanhos, em cristal líquido, em milhões de polegadas.

Ele ergue os braços. Há duas pizzas na camiseta azul. Imagino: deve ter chulé! Perto dos Rolling Stones, do U2 e do Depeche Mode, um show do Bon Jovi é meio brega, meio água com açúcar, meio produção pobrinha. Mas e daí? Lá vamos nós cantando outra vez.

Não faltaram hits. Bad Medicine deve ter tido uns 20 minutos, entrecortados até por uma cover de Pretty Woman. O público agindo como nas arquibancadas do vôlei masculino: gralhas e mais gralhas, felizes e contentes, ecoando para além do Hospital Albert Eistein. Poucas músicas novas. Uma pausa com cara de fim. E os pobres trabalhadores subindo a rampa, desesperados com a meia-noite. Veio ainda Bed Of Roses: nem Zezé di Camargo faria melhor. Mas e daí? Quem pagou, foi embora feliz.

"Toca Hey God!", eu gritei, em vão. E sumi na multidão 5 minutos mais cedo, para evitar a muvuca. Testemunhas dão conta de que Jon Bon Jovi sorriu até o fim.