segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Atenção, bebê!

                                                                                      Capa da revista Q de dezembro


Na semana em que Bono falou à Rolling Stone americana sobre a possibilidade do U2 acabar em 2012, a rádio Kiss FM resolveu ligar para minha amiga Evelyn Vavassori para saber se a notória fã zonanorteña, que já teve o maior fã-clube da banda no Brasil, estava triste com a notícia. "O fato do RPM ainda estar na ativa é muito mais triste do que o fim do U2", respondeu ela, para as gargalhadas do outro lado da linha. 

Podem espernear à vontade, mas seja lá qual for o destino da banda, são pelo menos 5 os álbuns do U2 a figurar entre os indispensáveis: Boy (1980), War (1983), The Unforgetable Fire (1984), The Joshua Tree (1987 -- longe de ser meu favorito) e Achtung Baby (1991). O último da lista acaba de ganhar mais uma prova de relevância e longevidade com Ahk-toong Bay-bi Covered, álbum comemorativo de 20 anos lançado com exclusividade pela revista britânica Q, de dezembro. 


As faixas ganharam novas versões assinadas por Patti Smith, Jack White, Depeche Mode e The Killers, entre outros. O maior desafio parece ter sido fugir das assinaturas e  traços instrumentais do grupo, a começar pelas guitarras cortantes de The Edge e pelos falsetes de Bono. Mas o resultado geral é positivo e até surpreendente em algumas releituras. 


A abertura ficou com o Nine Inch Nails, abusando dos efeitos eletrônicos para atualizar a sempre jovem Zoo Station. O clima de esquenta pré-balada prossegue com o remix de Even Better Than The Real Thing pelo DJ Stuart, sob alcunha de Jacques Lu Cont. Entram piano e violão para a interpretação compenetrada de Damien Rice em One. O histrionismo solar da versão original de Until The End Of The World dá lugar a uma pegada folk e instantaneamente cult da musa punk Patti Smith. O Garbage também baixa o tom, mas insere um clima mais pesado e hi-tech, imprimindo a marca da banda em Who's Gonna Ride Your Wild Horses.


A decepção fica com o Depeche Mode e sua versão excessivamente sintética de So Cruel, com direito a uns 30 moduladores de voz para peneirar a performance meio acima do tom de Dave Gahan. O irlandês Gavin Friday, sempre na bota do U2, surge com The Fly em mais um momento-conceito de pura robótica musical, levando a sério demais o conceito futurista da coisa. Quase toda a vida de Mysterious Ways se esvai no clima mais experimental já criado pelo Snow Patrol. Trying to Throw Your Arms Around The World, provavelmente a mais fraca do disco, ganha potencial pra agradar adolescentes na versão do The Fray. Mas o repertório só volta a crescer com a participação do Killers em uma corajosa performance de Ultra Violet, que começa com cara de Freddie Mercury e embarca sem contramãos numa repaginada vibrante e grandiosa, respeitando a pegada original.


Os escoceses do Glasvegas, por sua vez, se apegam à velha forma de Acrobat e acabam por apresentar a versão menos inventiva do disco, com direito a um trabalho de guitarra bem próximo ao de The Edge e vocais agressivos que pouco agregam  às emoções de 1991. A postura de Jack White é exatamente contrária, transformando a quase fúnebre Love Is Blindness num espetáculo cômico e explosivo, que cruza Tom Jones com Robert Plant. E era exatamente o que se esperava dele. Quanto tempo você vai demorar pra devorar todo o resto?










domingo, 30 de outubro de 2011

O Brooklyn ensolarado


Já tenho meu disco indie do ano e ele ainda nem foi citado no Brasil em meio a toda essa bajulação com Cut Copy & outros grupos amparados em melodias simplórias sobre efeitos dançantes repetitivos. Encontrei completamente por acaso enquanto zapeava pela tonelada de streamings da AOL. Estou falando de Wild One, estreia do North Highlands, com nome de subúrbio californiano mas baseado no Brooklyn novaiorquino e formado por gente da Califórnia, Chicago, e até África do Sul. Eles se conheceram na faculdade. O problema é que a economia americana está em recessão e eles não encontraram empregos. A solução é que eles desencanaram e foram viver de música.

São 11 faixas com instrumental de guitarras, violino, piano, sintetizadores e bandolim, além da delicada voz de Brenda Malvini. Enquanto isso, vale prestar atenção nas letras e composições sob medida para as questões existenciais dos beira-30: da busca pelo amor e realização pessoal, passando por humores mais desgostosos e nostálgicos, até a redenção das noites luminosas. Os arranjos são no mínimo simpáticos. Tudo que o Copacabana Club pode vir a ser se refinar um pouquinho mais o som e superar o puro "having fun", embora eles não tenham a menor obrigação de fazê-lo.

É ou não é a trilha perfeita para os filmes que ainda não fizeram sobre a nossa geração? (Hahahahaha) Exageros à parte, vou dispensar uma descrição das faixas com a condição de que você ouça as escolhidas e depois ganhe seu dia baixando o disco. 




sábado, 29 de outubro de 2011

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quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Os Dentes da Memória no Correio Braziliense

O Correio Braziliense deu página inteira para Os Dentes da Memória no sábado passado, 1º de outubro. Quem assina é Bernardo Scartezini, que fez um texto informativo bem pesquisado e uma das melhores análises sobre o livro até agora. 

Destaco também a baita ilustração e o trabalho de arte do jornal, bastante didático e agradável visualmente.  Deu gosto de ver. Segue abaixo reprodução do texto principal. Se não der pra ler, fique com o texto abaixo.



OS POETAS NA CIDADE




Os dentes da memória conta como Roberto Piva e seus amigos espantaram uma ainda pacata São Paulo com sexo, drogas & poesia



BERNARDO SCARTEZINI
ESPECIAL PARA O CORREIO





A fama de Roberto Piva o precedia. O jovem poeta já era figura conhecida na cidade de SãoPaulo no fim dos anos 1950. E nem era exatamente por sua obra poética, não. Era mais notório por invadir as festas dos bacanas, aprontar arruaças pelos bares da Avenida São João e por carregar por aí um séquito de jovens moços. Piva sempre preferiu os moços. Roberto Piva, ele próprio, mal chegara aos 20 anos de idade e já tomara uma decisão para toda a vida: se queria mesmo ser poeta, então que vivesse como tal. “Só acredito em poeta experimental que tenha vida experimental”, repetia para quem quisesse (ou não) ouvi-lo, citando como antecedentes os surrealistas franceses e os beatniks norte-americanos.

Roberto Piva era assim, uma espécie de neto de André Breton,filho de Jack Kerouac, sobrinho bastardo de Mario de Andrade e Oswald de Andrade. E ele não estava sozinho com seus livros, com seus antigos modernistas, com seus poetas & escritores de línguas estrangeiras. Piva não estava sozinho. Claudio Willer ainda era estudante secundarista do Dante Alighieri quando primeiro ouviu falar de Roberto Piva. Os dois se conheceram tempos depois, pela noite da grande cidade, apresentados por amigos em comum. Diz o Willer: “Eu já sabia quem ele era por causa da enorme fama de depravado e pederasta que ele tinha,de se envolver em todo tipo de confusão, além de ser culto, erudito, participar de grupos e estudar filosofia. Ele era o ‘personagem’. Isso desperta muito interesse quando você quer conhecer gente que saia da mesmice e do lugar comum”.

As afinidades eletivas. Os jovens poetas foram se conhecendo daquela maneira que uma pessoa conhecia a outra: em mesas de bares, em saraus, em sessões de cinema, em leituras de poesia, em bebedeiras mil. Piva era o grande agitador. Era o camarada que reunia o pessoal, que recitava poesia de cabeça, que trazia para o país os primeiros livros dos beats Allen Ginsberg, Lawrence Ferlinghetti, Gregory Corso... E era ele que via seu grupo de amigos como os beatniks de São Paulo. E eles logo começariam a semanifestar —também—por escrito. Para tanto, foi necessário encontrar a figura de um editor em Massao Ohno, um sujeito pouco mais velho que eles, dono de uma pequena gráfica à Rua Vergueiro, próximo à Liberdade. Ohno não era bom de copo como aqueles rapazes, mas animou-se o suficiente para lançar a Antologia dos novíssimos (1961). Seria a primeira vez para a maioria dos poetas ali publicados— e também seria a última para uns tantos.Um par de anos mais tarde, Piva daria à turma uma obra definitiva: Paranoia (1963).Um livro que passou em brancas nuvens pela imprensa, pela academia, pelo beletrismo, pelo bom gosto dos intelectuais da cidade. Ninguém parecia ouvir os impropérios de Piva— “quando eu ia ao colégio,Deus tapava os ouvidos para mim?”

Roberto Piva emendava imagens delirantes numa poesia sem métrica, ao mesmo tempo rebuscada e irada, trazendo para ao ventre da cinzenta São Paulo a lírica do desregramento que fora buscar em Garcia Lorca, Rimbaud e Lautréamont. Seus instantâneos de urbanidade poética eram refletidos nas imagens em preto e branco das fotografias do artista plástico Wesley Duke Lee. A partir desse momento definidor, ClaudioWiller também lançaria seus primeiros livros. Willer e Piva entrariam para a crônica paulistana como “a geração
dos anos 1960” ainda naqueles dias de farra. Bem mais difícil tem sido entrar para a história oficial da literatura brasileira. Ainda hoje estão à margem...

Escanteados por seus antecedentes da chamada Geração de 1945 (Guimarães Rosa, Clarice Lispector, Graciliano Ramos etc.) e menosprezados por seus contemporâneos concretistas (os irmãos Augusto e Haroldo de Campos, amigos e dissidentes). Esse cenário, no entanto, vem mudando nos últimos anos. Primeiro por conta das reedições de Paranoia pelo Instituto Moreira Salles (em 2000 e 2009). Depois,
com os três volumes das obras completas de Roberto Piva saindo pela EditoraGlobo (de 2005 a 2008). E agora o interesse pode ser ampliado com Os dentes da memória: Piva,Willer, Franceschi, Bicelli e uma trajetória paulista de poesia.

Juvenília&maturidade

Os dentes da memória surgiu como trabalho de graduação para as então estudantes de jornalismo Camila Hungria e Renata D’Elia. Elas se aproximaram de Roberto Piva e tiveram a sensibilidade de registrar o máximo de sua memória num momento em que a saúde do poeta declinava ferozmente—ele morreu em julho do ano passado. A partir da convivência com Piva, elas partiram para entrevistar amigos e colaboradores do poeta. Abriramo baú de memórias, que já havia sido mapeado pelo cineasta Ugo Giorgetti no documentário Uma outra cidade (2000), mas que ainda estava para ser impresso em livro. Camila e Renata fizeram mais de 40 entrevistas para poder amarrar a história—e as estórias—de Os dentes da memória. (Um título, aliás, tirado de versos de Piva em Poema de ninar para mim e Bruegel: “Rangem os dentesda memória/ segredos públicos pulverizam-se em algum ponto da América/ peixes entravados se sentam contra a noite...”). O livro traz quatro protagonistas destacados: Roberto Piva, Claudio Willer, Roberto Bicelli e Antonio Fernando de Franceschi. Mas eles não são os únicos a terem voz ativa na história oral deste Os dentes da memória. Ao contrário...

Num estilo semelhante ao usado por LegsMcNeil e GillianMc-Cain para reconstituir a história do punk rock no clássico livro Mate-me por favor (1997), Camila e Renata montam a narrativa diretamente nas palavras dos entrevistados, que se complementam mas também se contradizem com frequência, de maneira que as histórias de décadas passadas soam vivas e animadas por diferentes perspectivas. Os dentes da memória traz ainda poemas dos quatro autores.Embora em momento algum, vale dizer, procure se transformar em ensaio sobre aquelas obras. De certa forma, faz bem mais do que isso ao reunir testemunhos sobre a época e contextualizar vida e obra dos poetas dentro da recente e agitada história brasileira.

O primeiro terço do livro, nesse aspecto, é um grande barato—um prontuário de pequenas e médias contravenções praticadas pelos nossos anti-heróis juvenis... Roubar livros de livrarias era uma atividade compreendida e bem aceita no grupo. A casa dos pais deWiller, na represa de Guarapiranga, foi endereço certo para muitos fins de semanas perdidos. E acontecia até, uma vez ou outra, de eles saírem no jipe deWiller dando tiros ao alto em pleno bairro do Pacaembu, acordando a vizinhança. Todo esse clima, no entanto, azedaria com o golpe de 1964 e acabaria em definitivo com a promulgação do AI-5 em 1968. O tempo fechou para os ensolarados poetas.

Detalhe curioso: Antonio Fernando de Franceschi só estrearia em livro na década de 1980, mas ele conviveu com o grupo desde os primeiros encontros. Já Roberto Bicelli publicou apenas um único volume de poesia (Antes que me esqueça, de 1977), mas manteve-se fiel aos amigos, mantém-se. 


Além da poesia beat de Nova York & São Francisco, essa geração também deve ser definida pelo aspecto gregário, pelas aventuras coletivas, pelo companheirismo, pela cumplicidade. ClaudioWiller gosta de lembrar que, quando Roberto Piva apresentava um novo amigo para entrar no bando, os termos mais elogiosos que encontrava para dizer eram: “Este é um perfeito beatnik”. Uma vez dito isso, já estava dito tudo.

sábado, 8 de outubro de 2011

Open hearts, feel about it: Tears For Fears em São Paulo

A temporada de apresentações dos quarentões do Tears For Fears pelo Brasil começou com o pé direito na noite de 6 de outubro, em São Paulo. Não que o Credicard Hall seja lá o melhor lugar do mundo, mas pelo menos a boa acústica foi de grande serventia ao público que lotou a casa de shows para ouvir pérolas pops  criadas no auge da banda, entre 1983 e 1993, junto a canções mais recentes.

Roland Orzabal (voz e guitarra) e Curt Smith (voz e baixo) provaram o vigor do repertório num show correto e enxuto, com arranjos fieis aos originais. Os vocais soam como nos velhos tempos. As execuções foram mais curtas, sem improvisos e, vá lá, um tiquinho mais lentas e menos energéticas do que no DVD ao vivo Going To California (1990), para citar um exemplo à mão. Nada grave: difícil encontrar quem não tenha cantado e botado os bracinhos pro ar desde a abertura, com Everybody Wants To Rule The World, até o encerramento com Shout.

E teve até direito a uma lânguida & lenta versão para Billie Jean, de Michael Jackson, que o público aprovou. Head Over Hills e Sowing The Seeds Of Love -- exemplares nítidos da influência de Paul McCartney -- estão entre os pontos mais altos da noite.Advice For The Young At Heart  venceu no quesito emotividade. Mad World e Pale Shelter fizeram a alegria dos velhões. Na  falta de Oleta Adams, a voz feminina de Woman In Chains acabou vindo da garganta de um homem, o backing vocal canadense Michael Wainwright. Tudo na medida de um show sem surpresas e novidades, mas muito acima da média das bandas pops nascidas no neste século.