domingo, 11 de novembro de 2007

Travessia (parte I)

Por causa da minha tristeza, sei que de mim ele mais gosta. Sempre que estou entristecido é que os outros gostam mais de mim, de minha companhia. Por que? Nunca falo, queixa de nada. Minha tristeza é uma volta em medida; mas minha alegria é forte demais.


Desespero quieto às vezes é o melhor remédio que há. Que alarga o mundo e põe a criatura solta. Medo agarra a gente é pelo enraizado. Fui indo. De repente, de repente, tomei em mim o gole de um pensamento - estralo de ouro: pedrinha de ouro. E conheci o que é socôrro.


Os olhos que ele punha em mim, tão externos, quase tristes de grandeza. Deu alma em cara. Adivinhei o que nós dois queríamos - logo eu disse: -"Diadorim... Diadorim!" com uma força de afeição. Ele sério sorriu. E eu gostava dele, gostava, gostava. Aí tive o fervor de que ele carecesse de minha proteção toda a vida: eu terçando, garantindo, punindo por ele. Ao mais, os olhos me perturbavam; mas sendo que não me enfraqueciam. Diadorim.


Amigo? Aí foi isso que eu entendi? Ah, não; amigo, para mim, é diferente. Não é um ajuste de um dar serviço ao outro, e receber, e saírem por este mundo, barganhando ajudas, ainda que sendo como fazer injustiça aos demais. Amigo, para mim, é só isto: a pessoa com quem a gente gosta de conversar, do igual o igual, desarmado. O de que um tira prazer de estar próximo. Só isto, quase; e os todos sacrifícios. Ou - amigo -é quem a gente seja, mas sem precisar de saber o por quê é que é. Amigo meu era Diadorim; era o Fafafa, o Alaripe, o Sesfrêdo. Ele não quis me escutar. Voltei de raiva.

Trechos esparsos do romance "Grande Sertão: Veredas", de João Guimarães Rosa. Riobaldo. Travessia.

Nenhum comentário: