domingo, 19 de outubro de 2008

O diário de uma noite inusitada


Sábado

15:30. O telefone toca na mansão D´Elia: "Renata? É Jorge Mautner. Como está? Vocês ainda têm tempo de me entrevistar para o livro, ou já fecharam? Estou em São Paulo, farei um show hoje à noite na Associação Judaica... Centro de Cultura Judaica, isso mesmo! Você está convidada, aliás. Pode encontrar a mim e a Nelson Jacobina às 21:30? O carro vai nos apanhar às 22, de lá vamos para o hotel e terminamos lá, se não tiver dado tempo. Ok? Espero você".

16:00. O telefone toca na mansão grega do Bom Retiro, atende Paula Dume: "D´Elia? E aí? Bar? Vamos sim. Só depois das 21? O metrô vai funcionar até mais tarde? Ah, horário de verão? Você vai pagar? Ok. Eu vou. Vamos. Que horas no metrô?"

20:00. Na catraca de uma estação do metrô: "Paula, é o seguinte: você vai comigo fazer a última entrevista do livro, que já está em negociação há meses, mas estava difícil de acontecer até hoje à tarde. Vamos encontrar Jorge Mautner no Centro de Cultura Judaica e às 22 horas estaremos livre para ir à Mercearia São Pedro. Ok? Good".

22 horas, no Centro de Cultura Judaica: "Renata! Prazer em vê-la. Vamos então jantar próximo ao hotel em que estou? Washington, Carlos, vocês podem levar Renata e Paula no carro de vocês? Ótimo, nos vemos em meia hora".

22:45. Cantina do Sargento: Novos conhecidos comem, tomam cerveja e conversam sobre as eleições no Rio e em São Paulo, Barack Obama, bairros paulistanos, Ilhas Gregas, Portugal, a barbaridade do sequestro das meninas em Santo André,bruschettas de gorgonzola, pães de alho, e a cena cultural paulistana dos anos 60 e 70. Chega o ator Renato Borghi e rola um assunto sobre o Teatro Oficina, o Teatro de Arena, uma peça proibida em 1970 e a cerveja nem sequer subiu um pouquinho. A chuva cai forte do lado de fora, começou o horário de verão, já é domingo e são 2 da manhã. "Renata, foi um imenso prazer, agora nos falaremos com frequência e toda vez que você precisar me achar, basta telefonar, irei atendê-la prontamente". Um táxi, para a Vila Madalena. "Muito bacana que eles sejam tão agradáveis e educados assim, né D´Elia? Guardar boas impressões das pessoas é sempre prazeroso. Mas esquecemos de tirar ao menos uma foto da mesa toda pra guardar!"

Domingo

02:30, porta da Mercearia São Pedro:
20 Reais de táxi. "Estamos fechando, meninas. Uma cerveja? Ah, uma cerveja sim. Mas estamos fechando". Cadeiras sobre as mesas. Bebuns barbudos. Pessoas combinando a baladinha até as 7 da manhã. Um ruivinho fofo. A fila no banheiro. A chuva lá fora. "Que merda, Paula. Pra quê vir até aqui? Porque não ficamos ali pela Augusta, pela Paulista? Agora a gente vai ter que andar na chuva até algum outro bar. Não, não tenho cash, só cartão. Não tem banco 24 horas, os caixas eletrônicos fecham às 22. Chama ´Banco 24 horas´ porque sim, mas não funciona a noite toda. Não funciona porque não funciona, oras. Vou pedir pro Marquinhos passar meu Redeshop e trocar com dinheiro vivo, assim podemos pegar um táxi pra outro lugar. Quê? Ligar pro fulano? Ah, vamos ver se ele está por aqui..."

Nesse momento, Renata telefona para um amigo bêbado, que promete buscá-las e levá-las ao Astronete: "Hello girl. Yeah, I can pick you up. Where am I gonna take you? To heaven...hahahaha... well, I´m gonna take you both to another bar. But listen, I got a partner. Yeah, I just met her and we´re gonna do that things all night long. Of course it´s not a problem, huh? Right, I´ll be there in a few minutes. Yeah, we´re going to the bar all together and then, I´ll take the girl to my place".

03:30, na porta fechada do bar: "Chega, Paula. Vamos pra outro lugar, não vou ficar aqui esperando porque ele está completamente bêbado. E posso jurar que o vi passar por aqui de carro com a tal ´partner´, sem estacionar. Ou está bêbado, ou desistiu. Mas podia ter ligado aqui, né? `Hello, girl, I´m not going anymore cause I need to fuck my partner´. OLha, um táxi! Táxi? Olá, moço, quais bares ficam abertos até de manhã aqui perto"?

05:30, no Filial: "Eu vou bater nesse garçom se ele não parar de tacar copos de chope na minha frente sem requisição. Ele tirou meu caldinho de feijão sem eu terminar! E Paula, por favor, pare de tirar fotos com esse celular. Estou acabada. Quero dormir. Vamos embora de táxi porque não aguento mais sacolejar. A gente saca dinheiro num caixa eletrônico. Não, não é 24 horas mas abre às 6 da manhã. Quem está ganhando a corrida é o Hamilton? Que coisa mais chata essa Vila Madalena! A suuuuuper descolada e moderna Vila Madalena. Olhe ao seu redor: todos esses homens sentados, levantando copos e olhando as mulheres. O-L-H-A-N-D-O as mulheres! Eles me brocham. Eu vou encontrar a Raquel amanhã. Quer dizer, hoje. Se tivéssemos ido à despedida dela às 3 da manhã, teríamos dado com as caras na porta. Essa cidade sucks. Olha o preço dessa conta! Assim não dá. Desse jeito não dá pra ficar nesse lugar. Desse jeito e com mais 4 anos de Kassab, I give up. Eles vão instaurar a lei "cama limpa", por um sexo mais asséptico, livre de impurezas. Mas pra esses caras aqui não deve fazer diferença nenhuma. Assim não dá. Peguem essa cidade pra vocês. Eu vou para a praia! Mas primeiro, vou pra casa dormir. Vamos então? Táxi!"