Acabo de reler um capítulo do professor americano Douglas Kellner em seu livro A Cultura da Mídia. Trata-se de um pequeno ensaio comparando Laurie Anderson e Madonna, dois grandes ícones da cultura pop e do chamado pós-modernismo, cada qual em seu estilo de reivenção. Fica bastante vago comentar o texto todo aqui, mas deve fazer algum sentido no fim das contas.
A grossíssimo modo, podemos resumir assim: as performances artísticas de Laurie [figura ligada à vanguarda novaiorquina dos anos 70 e 80] dialogam com as artes plásticas, promovem uma experimentação musical mais profunda e causam perplexidade - sem oferecer conclusões prontas - enquanto Madonna faz um pastiche de referências, centraliza todas as atenções e aposta em personagens carregadamente estereotipados para provocar o choque, em canções estritamente radiofônicas.
Toda a caracterização de Madonna é afirmativa e autocrática - mesmo quando se trata de ambiguidade e sexual. Por outro lado, a androginia dos clones de Laurie denota "fragilidade na identidade pessoal e sexual": uma imagem comercialmente inviável.
"Laurie é uma artista performática e vanguardista. Madonna é a rainha do pop", como diz o próprio Kellner. A primeira desconstrói a expressão, fragmenta sigificados, implode estilos musicais e produz significados que não significam muito mais do que si mesmos - é pós-moderna na gênese. Mas não investe em comentário social e não profere uma mudança de comportamento ou define qualquer tendência nesse sentido.
Enquanto isso, "Madonna está sempre promovendo sua versão de feminismo, de liberação sexual e de autocriação", além de trabalhar com maestria a pluralidade de significados nos videoclipes, por exemplo.
Ainda bem que nada é tão simples ou dicotômico. Mas na verdade, é muito curioso que essas duas se apresentem no Brasil com intervalo de apenas dois meses. Primeiro a genial Laurie [no vídeo abaixo em Language is a Virus], uma das melhores contadoras de histórias do planeta. Depois Madonna, a referência pop absoluta.