quinta-feira, 28 de agosto de 2008

O Escafandro e a Borboleta

Jean Dominique Bauby acaba de acordar após três semanas em coma, decorrência de um grave AVC. Aos 42 anos, ele está deitado na cama de um hospital, sem conseguir se mexer e bradando forte por entendimento; mas ninguém pode ouvi-lo. Jean Do por sua vez, pode ouvir, imaginar e raciocinar mas não consegue usar a boca, a língua e as cordas vocais. Está completamente paralisado, exceto por seu olho esquerdo.

Jean Do prefere morrer do que viver trancafiado em seu próprio corpo. Por insistência de suas terapeutas, resolve se submeter a uma espécie de treinamento para que consiga se comunicar: conforme lhe ditam o alfabeto, ele pisca para indicar as letras e formar palavras. Forma frases, parágrafos e textos. Resolve então usar o método para "ditar" um livro narrando sua experiência.O Escafandro e a Borboleta foi lançado em 1997, uma semana antes de sua morte.


O pintor e cineasta Julian Schnabel topou transformar a história em filme no ano passado, por insistência dos produtores, após refletir sobre a morte do pai. Sua equipe filmou no hospital francês onde Jean Do ficou internado, com Mathieu Amalric no papel principal. O cineasta arrebatou o prêmio de Melhor Diretor no Festival de Cannes (2007), entre outras honrarias.

Schnabel está acostumado a transpor aos filmes sua impressão sobre histórias reais bastante comoventes. Foi assim com Basquiat (1996) e Antes do Anoitecer (2000), baseado na auto-biografia de Reinaldo Arenas, escritor cubano perseguido pelo regime de Fidel Castro. O papel rendeu a Javier Barden sua primeira indicação ao Oscar de Melhor Ator.

O Escafandro e a Borboleta é, no entanto, seu trabalho mais bem realizado na linguagem cinematográfica. A começar pelo hábil roteiro de Ronald Harwood, que promove uma incursão nas aflições, memórias e reflexões do personagem principal. O texto valoriza o riquíssimo mundo da imaginação em que agora vive Jean Do, com uma bem sacada narrativa em off. Mas o grande trunfo do filme é mesmo a fotografia de Janusz Kaminski, cheia de truques artesanais (sem efeitos de pós-produção), com a câmera partindo quase sempre da perspectiva do olho esquerdo de Jean Do.

Há certo exagero em afirmar, como fez a revista The New Yorker, que se trata do "renascimento do cinema". Mas o filme é "inspirador e impressionante" sim, como disseram no New York Times. Criativo o suficiente para atribuir a Julian Schnabel um importante papel no cinema autoral americano. O próximo passo dele, aliás, é o longa Lou Reed´s Berlin. Sugestivo nome...