"Tente imaginar o seguinte: você tem 25 anos; nos últimos cinco anos de sua vida, você se tornou, primeiro, um campeão dos direitos humanos, herói da política estudantil, trovador querido dos universitários e de todas as colorações da esquerda. Depois, numa velocidade que lhe parece absolutamente alucinante, você se viu no trono do estrelado pop, adorado agora por multidões de jovens. Só alguém foi tão famoso em seu país, os Estados Unidos: Elvis Presley era um bronco, um ingênuo, uma criatura de seu empresário. E você, não: você sofre de lucidez crônica, muitas vezes paranóica, um lirismo brotando pôr todos os poros, uma consciência crítica que não o deixa dormir. Você leu, foi ao cinema, gosta de poesia. Mas, hoje, na América ninguém é mais famoso do que você", Ana Maria Bahiana, em 1986, Blonde On Blonde, do Bob Dylan
"No quarto de um hotel de segunda, em San Antonio, Texas, o garoto negro, alto, magro e elegante senta-se voltado para a parede, um enorme microfone à sua frente, o violão de aço National-Steel sobre o joelho. Um fio corre pelo chão de madeira até o outro quartinho, onde, concentrados, atentos, maravilhados, dois homens brancos de meia-idade manipulam pesados gravadores de rolo. Faz frio, uma fria noite de novembro de 1936. Olhos fechados, o garoto toca - alguém na sala de controle comenta que não é possível: deve haver mais alguém com ele no quarto. Como é que estamos ouvindo acompanhamento e solo ao mesmo tempo? Mais que isso - que tristeza, que tristeza infinita, que doçura angustiada nessas cordas. O garoto canta, uma voz aguda e ligeiramente fanhosa, e a primeira impressão é de transe, trânsito, fuga, como capturar o vento. Depois, abre-se um universo escuro, um poço das mais absolutas paixões - cada blue é curto, curto, dois minutos e pouco, cantado com quem perseguisse ou fosse perseguido. Nem amor, nem desejo, nem desespero: um pouco de cada uma dessas emoções e mais alguma outra coisa, alguma coisa que remonta à mais básica humanidade, fatalidade, destino, morte. O garoto é Robert Johnson, 25 ano, nascido (presumivelmente) no vilarejo de Hazelhürst, Mississipi", Ana Maria Bahiana sobre King Of The Delta Blues Singers, do Robert Johnson.
"No quarto de um hotel de segunda, em San Antonio, Texas, o garoto negro, alto, magro e elegante senta-se voltado para a parede, um enorme microfone à sua frente, o violão de aço National-Steel sobre o joelho. Um fio corre pelo chão de madeira até o outro quartinho, onde, concentrados, atentos, maravilhados, dois homens brancos de meia-idade manipulam pesados gravadores de rolo. Faz frio, uma fria noite de novembro de 1936. Olhos fechados, o garoto toca - alguém na sala de controle comenta que não é possível: deve haver mais alguém com ele no quarto. Como é que estamos ouvindo acompanhamento e solo ao mesmo tempo? Mais que isso - que tristeza, que tristeza infinita, que doçura angustiada nessas cordas. O garoto canta, uma voz aguda e ligeiramente fanhosa, e a primeira impressão é de transe, trânsito, fuga, como capturar o vento. Depois, abre-se um universo escuro, um poço das mais absolutas paixões - cada blue é curto, curto, dois minutos e pouco, cantado com quem perseguisse ou fosse perseguido. Nem amor, nem desejo, nem desespero: um pouco de cada uma dessas emoções e mais alguma outra coisa, alguma coisa que remonta à mais básica humanidade, fatalidade, destino, morte. O garoto é Robert Johnson, 25 ano, nascido (presumivelmente) no vilarejo de Hazelhürst, Mississipi", Ana Maria Bahiana sobre King Of The Delta Blues Singers, do Robert Johnson.
"Imagine o início dos anos 60 na desbundada Califórnia. Uma turma de adolescentes que acreditava no sonho, na paquera e na inocência de um beijo vermelho. A praia. As pranchas. O biquíni. Os flipantes filminhos com Frankie Avalon e Annette Funicello. As festinhas embebidas em lilás. As carangas envenenadas. A aventura do rock'n'roll e a lágrima do rock ballad. E aquela loirinha que não queria nada com ninguém. Em meio a essa deliciosa atmosfera é que nasceram os Beach Boys, um dos mais influentes e legendários grupos da pop music. Formado em 61 pelos irmãos Wilson (Brian, Dennis e Carl), o primo Mike Love e Alan Jardine, eles gravaram mais de trinta LPs, deixando uma vasta influência que vai desde Beatles a Ramones", Fernando Naporano, 1987, sobre Pet Sounds, dos Beach Boys.
"Eles detestam os palcos, as entrevistas e os fotógrafos. Amam jazz, literatura beat, perfeccionismo e sexo. O nome foi afanado dos dildos de borracha que povoavam o livro The Naked Lunch (Almoço Nu aqui. no Brasil), de William Burroughs. E a idéia inicial era fazer um pop simples, que se tornaria sofisticado com o passar dos anos. Dito e feito: quando em meados de 72 iniciaram as gravações de Can't Buy A Thrill, já possuíam um grau de sofisticação pouco comum aos grupos de caráter pop da época - como The Grass Roots e Three Dog Night, além de já terem tocado em várias bandas e composto para muita gente." Fernando Naporano, 1993, sobre Can´t Buy Thrill, do Steely Dan.
"Algumas vidas se revelam como nota de rodapé, a sombra, o apêndice de um único gesto da juventude. Por mais que um artista queira se subtrair do estigma, este se impõe contra a vontade do criador, como letra marcada a feno. Aos 46 anos de idade, o compositor e cantor carioca Luiz Melodia tenta esquecer em que ano estamos - exatamente como nos versos de "Pérola Negra". a faixa-título do seu primeiro LR de 1973. Houvesse ele abandonado a carreira para virar contrabandista na África, como o poeta Arthur Rimbaud (outro maldito pelos feitos juvenis), ainda assim seria lembrado por causa de Pérola Negra. Estacou ali, aos 23 anos, num ano que todo mundo já esqueceu, salvo ele", Luis Antonio Giron, 1996.
"Grace Jones é um buraco negro no universo pop. Os mais variados projetos artísticos sucumbem à imensa força sedutora dessa mulher mais que fatal. Já estamos em outra dimensão: aqui só interessa as aparências, todas as atitudes são simuladas e a jogada de marketing tem mil vezes mais importância que qualquer vestígio de autenticidade. Grace Jones é um produto perfeito (ela canta: "Eu não sou perfeita, mas sou perfeita para você"), um personagem que usa e abusa da mídia para a felicidade geral de seus consumidores. Seus discos são absolutamente descartáveis e, por isso mesmo, geniais", Marcel Plasse, sobre Nighclubbing, da Grace Jones.
"É duro ser um garoto de doze anos afundado até o queixo no lodoso tédio urbano. Todo mundo dá palpite na sua vida. O status em casa e na rua, a voz e até o corpo ainda são de criança - mas os instintos são de homem, e as garotas, todas ficando peitudas, não estão nem aí com você. Escrotas. Piranhas. A única saída é dar uma de muito mais durão do que você realmente é. Começar a beber, fumar, bater punheta direto. E estar pronto para sacrificar qualquer ciosa por alguns momentos de diversão adrenal", André Forastieri, sobre o primeiro dos Ramones, em 1991.
"Rock como objeto de culto. Disco como conceito, grande arte. Foram desvios inesperados - e, pensando bem, um pouco ridículos - para um tipo de música desencanada que começou animando bailinhos teen. Mas os anos 70 foram mesmo inesperados, e todo mundo que cresceu nessa época é meio esquisito. Não vejo a hora de elegermos nosso primeiro presidente da República... alguém que saiba quem é o Space Ghost e tenha sonhado com uma calça Topeka. De qualquer forma: se essa pretensão roqueira toda se justificou alguma vez, foi na primeira metade dos 70. Dark Side Of The Moon, Physical Graffiti, Ziggy Stardust - naquela época gigantes caminhavam sobre a Terra, ou assim parecia. Dentre esses inesquecíveis pedaços de plástico, nenhum alcançou a sobrevida de A Night At The Opera. Porque o Queen nunca parou de produzir, porque mudou de estilo, porque eles eram imensos no palco, porque Freddie Mercury foi o primeiro superastro a morrer de Aids, porque...", André Forastieri, 1992, sobre o clássico do Queen.
"Você já imaginou como seria o mundo sem o Kiss? Reflita durante um momento. Pense nos dinossauros progressivos dos anos 70, tipo Emerson, Lake And Palmer e Yes, querendo destruir o bom humor da raça humana. Pense em quantos caras compraram uma guitarra depois de ver e ouvir Ace Frehley. Pense em quantas festanças já não foram embaladas por "Rock'n'roll All Nite". A conclusão não poderia ser outra: Ace, Gene Simmons (baixo), Paul Stanley (vocal/guitarra) e Peter Criss (bateria) salvaram o rock'n'roll. O quarteto botou demência onde só havia pretensão e virtuosismo assexuado, por isso lhe somos eternamente gratos. David Bowie, Marc Bolan e os New York Dolls já haviam jogado purpurina nos anos 70, mas nenhum deles atingiu tanta gente quanto o Kiss. Mas até hoje este planeta ingrato despreza os quatro mascarados de Nova York. Você já viu "Hotter Than Hell", "Destroyer", "Rock And Roll Over" em alguma lista dos melhores álbuns da história? As pessoas "sérias" não gostam do Kiss porque o grupo é uma mancha na imaculada história dos heróis do rock. Gene & Cia. não estavam a fim de protestar contra nada, pouco ligavam para a guerra do Vietnã ou para a miséria do mundo. Só queriam mesmo se dar bem com as mulheres, encher o bolso de grana e se divertir com o rock'n'roll. E conseguiram!", André Forastieri, sobre o Destroyer do Kiss, em 1993.
"Musicalmente, cá entre nós, é menos que um álbum: são quatro singles arrasadores, duas ou três faixas bacaninhas e outras francamente indigentes. O primeiro LP de Madonna, homônimo, quase todo composto por ela, tem cotação melhor no Ali Music Cuide e muito melhor lá em casa: é autoral, é black, sexy e dançante Para o consumidor, o disco mais recomendado é a coletânea Imaculate Collection- mesmo porque a nova edição de Like A Virgin exclui "Into the Groove", feita para a magistral trilha de Procura-se Susan Desesperadamente. Mas isto não é um disco, é um marco sociológico. A emancipação da mulher ocidental deve duas ou três coisas a ela. E Madonna tal como a conhecemos deve a carreira a este álbum e a dois de seus clipes", Pedro Só, 2006, falando sobre Like a Virgin, da Cadela.
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