sábado, 27 de junho de 2009

Michael Jackson e o cidadão de bem

Suponhamos que Michael Jackson tenha sido pedófilo. Sim, suponhamos, porque nada foi provado judicialmente e diante dos sanguessugas ao redor dele, é preciso atenção redobrada. Em 1993, veio a primeira acusação. O molestado seria um garoto de 13 anos que fora visto ao lado do ídolo em diversas ocasiões públicas, inclusive junto a outras crianças, viajando pelo mundo de primeira classe, curtindo a badalação da fama, e dormindo em hotéis 5 estrelas com um estranho enquanto deveria frequentar a escola e dormir na casa dos pais. Antes que o cantor fosse a julgamento, houve um acordo milionário para que o pai do garoto retirasse a queixa. Abafou-se o caso. E com tanto dinheiro no bolso, supõe-se que tenham acabado os problemas da família do garoto. Os de Michael Jackson, em compensação, estavam longe de terminar.

Até os habitantes de Neverland (sic) sabem muito bem que o dinheiro corrompe. E a julgar pelo exemplo, é capaz de resolver problemas tão sérios quanto as marcas profundas de um garoto molestado sexualmente. Tudo muito simples. Mas a primeira pergunta é: se o seu filho de 13 anos sofresse abusos do tipo, você aceitaria dinheiro para abafar o caso ao invés de ver seu agressor na cadeia, pagando pelos seus atos? O que é mais importante: a justiça - e segurança de outras possíveis vítimas - ou uma bela dinheirama na sua conta?

Poucos anos depois, vieram novas acusações. Sem acordo financeiro desta vez. A polícia da Califórnia revistou a casa de Michael Jackson, cercou seus funcionários, amigos, família, buscou testemunhas e investigou o caso, como manda o figurino. Michael Jackson foi algemado diante das câmeras de TV do mundo inteiro. Julgado num tribunal de Santa Mônica, foi absolvido. Herdou dívidas supotamente maiores do que sua fortuna. Não conseguiu se recuperar do baque. Mesmo morto e reconhecido como o maior artista pop de todos os tempos, levou consigo, entre outros títulos contraditórios, o de pedófilo.

Mas espere aí, meu honrado cidadão de bem: você teria deixado seu filho dormir na casa de um homem recluso, solteiro, esquisitíssimo e que já foi acusado de pedofilia? Mesmo que nada tenha sido provado, sobram indícios: comportamento infantil, parque de diversões particular, histórico de agressão durante a infância, desequilíbrio psicológico, milhões de dólares na conta bancária, e claro, muitos mimos, presentinhos e uma alta dose de magnetismo pessoal para atrair crianças indefesas. Mmmmm, pensando bem, pode render um bom dinheiro, não? E se o "comedor de criancinhas" fizer uma reforma na sua casa, te der um carro, financiar os estudos de seus filhos e ainda por cima, for um grande artista pop? Você pode até conseguir alguma fama em cima dele! E depois de tudo - mesmo que ele não tenha feito nada - você pode meter um processo no cara e ganhar uma boa grana. Mudou de ideia agora?

Suponhamos que você tenha deixado sua criança inocente passar um final de semana com Michael Jackson. Surpresa: ele abusou do seu filho! Quem será mais culpado? Você ou pedófilo? Esta é a grande hipocrisia dos honrados "cidadãos de bem", pais de família que, numa vaidade monstruosa, entregam seus filhos de bandeja, como se fossem prostitutas informais.

Eu não sei se Michael Jackson molestou crianças. Espero que não. Sobre ele, me interessam outras coisas. De acordo com a justiça, não houve crime. Mas o que acontece entre quatro paredes envolvendo um homem e uma criança - que nem deveria estar lá - só eles podem saber. No entanto, me parece muito mais cômodo, especialmente na preguiça de pensar, escolher umas fotos bizarras na internet, zombar do nariz que desmancha e de todas as estranhezas desse cavaleiro da triste figura, numa espécie de linchamento moral de um fantasma vivo, coisa que se arrastou por uma década e meia.

Essa é uma prática muito comum, especialmente entre os hipócritas, já que é muito mais cômodo fazer juízo de um "ser humano deplorável" que eles nunca conheceram. Diante da situação, eu não teria tanta repulsa de Michael Jackson. Teria medo mesmo é do "cidadão de bem".

3 comentários:

Juan Trasmonte disse...

Que Michael era um cara estranho ninguém pode negar, e daí? O Camelo também é, mas ainda não fez nenhuma música que chegue no chinelo de Billy Jean. E por falar em Jacko, quem não tiver um presunto In the Closet, que jogue a primeira pedra.
Em todas as duzentas crônicas que li nas últimas 48 horas, ninguém tinha escrito tão lindamente quanto você o resumo da história: dizer que aprendeu gravidade com Michael Jackson é de uma poesia infinita.
Você jamais será reserva de mercado, minha filha.
Beijos

Mary disse...

I do agree with you, darling. Pior é chamarem o cara de racista, puta merda. E olha que os brancos dizem isso, aí sim que é hipocrisia. Eu não sei nem se ele abusou de mirins nem como e porque diabos o cara ficou branco, e vamos parar com a hipocrisia não? Tem muito preto por aí que faria a mesma coisa se pudesse, figuras públicas viram alvo de conteúdos reprimidos do incosciente popular.

Denis Pacheco disse...

Renata, concordo ipsis litteris com seu texto. Inclusive, estava lá eu ontem defendendo a mesma "tese" para uma amiga. Simplesmente é ilógico que após uma acusação de pedofilia e N suspeitas, pais em sã consciencia autorizem seus filhos a passarem dias (e noites) na Terra do Nunca de um possível pedófilo.

Para mim, o ângulo de golpe está claro, a ganância perpassa famílias e a pecha (essencialmente) americana de "deus, pátria e família" encontra-se mto bem representada nos acusadores de Michael Jackson. Acredito (digo e repito, "é uma questão de fé") que ele não é e nem nunca foi culpado de todas as acusações que lhe fizeram. MJ é um alvo fácil, num mundo movido por interesseiros, numa região de abutres. Recentemente, até mesmo a ex-mulher (a Lisa) declarou que um dos grandes problemas dele era estar rodeado de falsos amigos, vampiros hollywoodianos em sua melhor forma.

Gostei bastante do texto e assino embaixo