terça-feira, 24 de novembro de 2009

O que eu não vi e o que preciso ver


Nessa onda de listas que não acaba mais -- e vocês sabem que eu adoro listas --, resolvi botar num papel imaginário chamado Microsoft Word uma lista com todas as bandas e artistas que eu vi, ao vivo, nos palcos daqui e de minhas raras viagens pra fora dessa pátria amada. Mas contar vantagem é fácil. Difícil é assumir que você comeu bola. Ou que nasceu na época errada. Ou que perdeu... você perdeu, playboy!

Doloroso é tomar nota da quantidade de coisas que você daria um dedinho para assistir, mas não vai rolar nessa vida. Deliciante, no entanto, é planejar, fazer figuinhas e mentalizar a glória: ver aquele show daquele artista que você ama e que não pode morrer ser ver - nem esperar que ele morra pra ficar viuva & frustrada.

Além da minha listinha, convidei alguns amigos pra responder às questões. Já dá um termômetro. Grandões & grandonas do entretenimento: façam uma forcinha pra trazer os vivos!. E que os mortos sejam deixados em paz.

Renata D´Elia, jornalista, São Paulo
O que eu preciso ver: David Bowie, PJ Harvey, Pixies, Portishead, Depeche Mode, Peter Gabriel, Stevie Wonder, Nick Cave, Lou Reed, Morrissey, Bryan Ferry, Paco de Lucía
O que nessa vida não dá mais: Michael Jackson, Queen, Marvin Gaye, Janis Joplin, Miles Davis, James Brown, Ray Charles, Serge Gainsbourg, Elis Regina [e bônus pro meu querido Michael Hutchence].

Ary França, ator, São Paulo
O que eu preciso ver: Zeca Pagodinho
O que nessa vida não dá mais: Michael Jackson

Fabio Carbone, controller, São Paulo
O que eu preciso ver: Decemberists, Andrew Bird, Of Montreal, Pavement completo
O que nessa vida não dá mais: Pink Floyd, Beatles, Led Zeppelin, Doors

Silmara Ferreira, publicitária, São Paulo
O que eu preciso ver: David Bowie, Depeche Mode, Morrissey, The Cure, Bon Jovi
O que nessa vida não dá mais: INXS com Michael Hutchence, The Doors, Jeff Buckley, Nirvana

Daniela Dolme, estudante, São Paulo
O que eu preciso ver: Foo Fighters
O que nessa vida não dá mais: Marvin Gaye, Cazuza, Ray Charles.

Rodrigo Kurtz, designer gráfico, Florianópolis
O que eu preciso ver: Gotan Project e Bajofondo
O que nessa vida não dá mais: Moloko e No Doubt

Marcelo "Billy" Comodoro, músico, São Paulo
O que eu preciso ver: Quens Of The Stone Age e Rage Against The Machine
O que nessa vida não dá mais: Led Zeppelin e Beatles

Marcelo LaFarina, jornalista, São Paulo
O que eu preciso ver: Misfits, Billy Talent
O que nessa vida não dá mais: Lupiscinio Rodrigues

Patris Rocha, musicista e publicitária, Belo Horizont
e
O que eu preciso ver: Talvez a Beth Gibbons...
O que nessa vida não dá mais: Todo mundo já mudou de lado! Nem preciso falar que queria ver Michael Jackson´s This Is It, versão heaven!

Larissa Rodrigues, professora, Porto Alegre
O que eu preciso ver: Stevie Wonder. Aretha Franklin? Sei que nem vou ver, mas ter esperança é bonito. Ah, eu queria ver a Alicia Keys antes dela se chegar pros lados dos manos do gueto-milionário.
O que nessa vida não dá mais: Michael Jackson, Beatles, Elvis Presley, Frank Sinatra, Elis Regina.

William Bernal, estudante, São Paulo
O que eu preciso ver: Elvis Costello, Caetano, Stones, Gal, Bob Dylan, Tom Waits, Luiz Melodia, The Who, Pixies, White Stripes, Herbie Hancock
O que nessa via não dá mais:
Beatles, Ray Charles, Tim Maia, Billie Holiday, Johnny Cash, Tom Jobim, Miles Davis, Frank Sinatra, Joy Division, Serge Gainsbourg.

Tiago Andrade, blogueiro e podcaster, São Paulo
O que eu preciso ver: Pearl Jam
O que nessa via não dá mais: Frank Zappa

Bruno Lofreta, jornalista, São Paulo
O que eu preciso ver: Flogging Molly, Yo La Tengo e Michael Hurley
O que nessa vida não dá mais: John Coltrane e Elliott Smith

Danilo Gomes, técnico em informática, Campinas
O que eu preciso ver: Stevie Wonder, Alicia Keys, Prince, Raphael Saadiq, Maxwell, Brian McKnight, Beyoncé, Quincy Jones & convidados.
O que nessa vida não dá mais: Michael Jackson, Chic, Luther Vandross, The Carpenters, ABBA, James Brown, Queen, Os 3 Tenores.

Fabiana Schiavon, jornalista, São Paulo
O que eu preciso ver: Metallica (tá quase), Beck e Foo Fighters.
O que nessa vida não dá mais: Quero morrer porque eu não vi os Ramones (não consegui comprar o ingresso do último show que eles fizeram por aqui). Inconsolável.

Miguel Bandeira, publicitário, São Paulo

O que eu preciso ver: Pixies
O que nessa vida não dá mais: Jimi Hendrix

Rita Squillace, relações públicas, São Paulo
O que eu preciso ver: Paul McCartney
O que nessa vida não dá mais: De Elvis Presley a Vinicius

Rogério Marques, historiador, Rio de Janeiro
O que eu preciso ver: Depeche Mode, Peter Gabriel, Tears For Fears, Pearl Jam, White Stripes, Duran Duran
O que nessa vida não dá mais: Michael Jackson, Queen, Oingo Boingo

Renato Limão, músico e relações públicas, São Paulo
O que eu preciso ver: Ninguém que eu não tenha visto. O Paul McCartney vem ano que vem. Mas veria BB King, novamente.
O que nessa vida não dá mais: Michael Jackson, Ray Charles, Stevie Ray Vaughan

Lanna Morais, jornalista, São Paulo
O que eu preciso ver: Depeche Mode, New Order, David Bowie, Bob Dylan,Paul Simon, Chico Buarque
O que nessa vida não dá mais: Serge Gainsbourg, Legião Urbana, Michael Jackson, Dead Can Dance, Beatles, Miles Davis

Augusto Facundo, professor universitário, São Paulo
O que eu preciso ver: Van Halen, Depeche Mode, Dire Straits, Pink Floyd, Jorge Benjor
O que nessa vida não dá mais: Michael Jackson, Frank Sinatra, Tim Maia, Allan Parsons Project, Art Of Noise, Jimi Hendrix, The Beatles







quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Cinema 2000´s



O The Times elegeu semana passada os 100 melhores filmes da década. Acho um pouco precoce. O problema, queridinho (a), é que eu não vou perder meu tempo fazendo uma crítica pedante e pretensiosa de cada um deles: se você quer resenhas para caçar argumentos e gastar com os deslumbrados, vá ler os grandes nomes, que dão muito mais status do que eu. Só quero agora me divertir e participar da trívia.

Aqui a proposta é pegar uma cervejinha, pedir umas batatas fritas, e dar pitacos nas mesinhas da calçada -- afinal, faz um calor e tanto em São Paulo--, enquanto eu descrevo os que considero mais importantes, pelo que acompanhei de cinema e também pelos meus gostos e filtros emocionais. Você vai perceber que deixei alguns mexicanos medalhões [mexicano + medalhão = mexilhão?] de fora. Não citei os infantis, mas Deus salve a Pixar e a visão de Alfonso Cuarón para Harry Potter. Também não liguei muito para os asiáticos. E nem fui ponto a ponto em cada item da lista. Mas, relaxa, cara: ficará longe dos 100 títulos.

Na ordem cronológica:

1) Cidade de Deus (Fernando Meirelles, 2000)

2)
O Pântano (Lucrecia Martel, 2000)
Não entendi como nem o porquê de terem deixado um dos melhores da década de fora. E eu que colocaria pelo menos mais 1 dos 3 longas de Lucrecia nesse bolo, o grande La Niña Santa (2004) já que La Mujer Sin Cabeza (2008) segue inédito em alguns países, inclusive esse aqui. Além de trabalhar a decadência, as relações muito loucas entre catolicismo, família, sexualidade e o mal estar com ironia, Lucrecia Martel é talvez a cineasta mais auditiva e olfativa do circuito mundial. Quero dizer: assista os filmes, escute cada detalhe, e sinta o cheiro das piscinas sujas e dos atritos entre as peles dos personagens.

3) Quero ser John Malkovich (Spike Jonze, 2000)

4) O Fabuloso Destino de Amelie Poulain (Jean Pierre Jeunet, 2001)
Saia perguntando: bata nas portas, toque as campainhas, acorde as mulheres na faixa dos 25 aos 30; pergunte nos bares, mire as moças de saia, as garotas distraídas pelas vitrines das livrarias, as estudantes nas estações do metrô: qual delas não é, não foi e nunca vai ser Amelie Poulain? Quem é que nunca mergulhou as mãos e braços pelos feijões na quitanda, até tocar o pozinho guardado abaixo dos grãos? Quem é que nunca fez uns tricky games como aquele para ...[ops! paremos por aqui].

Jean Pierre Jeunet penetrou fundo no lúdico e na beleza da memória afetiva, com a mesma facilidade do braço num saco de feijões: primeiro num puta over narrativo de abertura, depois nas projeções de uns personagens nos outros, e por fim no amparo da incrível trilha sonora de Yann Tiersen, também uma das melhores da década. Apareceu Tatou, Audrey: um ícone. Já basta de motivos.

5) Os Excêntricos Tenenbaums (Wes Anderson, 2001)


E até a mala da Gwynith Paltrow se deu bem: seu melhor papel está aqui.

6)
O Filho da Noiva (Juan José Campanella, 2001)
Não está na lista do The Times. Mas eles não sabem nada da Sudamérica. Nem de Ricardo Darín, Hector Alterio e Norma Aleandro. O clichê-dramalhão que tantos temem amar não é tão clichê e não tem nada de ofensivo. Vale também pelo peso da chamada "buena onda" do cinema argentino (que fim teve a "buena onda"?), vale pelo rabo do foguete de La Quiebra, como vale pelo humanismo do belo Kamchatka, de Piñeyro, que cito logo abaixo.

7)
A Professora de Piano (Michael Henake, 2001)
Uma das melhores atrizes do mundo está escondida na cabine de um cinema pornô e eu não vou estragar a surpresa para quando você abrir a cortinininha.

8) As Horas
(Stephen Daldry, 2002)

Foi a primeira vez que prestei atenção em Julianne Moore, a primeira vez que escutei uma trilha de Phillip Glass, a primeira vez que ouvi falar em Virginia Woolf, a primeira vez que vi Nicole Kidman efetivamente trabalhar, e que Ed Harriss e Meryl Streep efetivamente me convenceram. Geracionalmente importante.

9) Kamchatka (Marcelo Piñeyro, 2002)

10) Fale com Ela (Pedro Almodóvar, 2002)

11) Tiros em Columbine (Michael Moore, 2002)


12) Kill Bill (vol. 1 e 2, 2003 e 2004, by Quentin Tarantino)
Alguma outra coisa foi tão pop quanto Hattori Hanzo, Beatrix Kiddo, Green Mamba, Pai Mei, Bill, matanças gore e trilha sonora de filme pornô italiano dos anos 70 misturada com black music vintage? Nem o próprio Quentin Tarantino.

13) Dogville (Lars Von Trier, 2003)


14) Brilho Eterno de uma Mente Sem Lembranças (Michel Gondry, 2004)
Para além do exercício autoral criativo e xaropado de Quero ser John Malkovich e Adaptação, ambos dirigidos por Spike Jonze, o roteirista Charlie Kauffman realizou aqui um tipo de roteiro quebra-cabeças em que passado, futuro, memória e destino se misturam de um jeito tão epifânico nas vidas de Jim Carrey e Kate Winslet, que quando eu e minha amiga Evelyn saímos do cinema na Avenida Paulista, em absoluto silêncio, era como se vivêssemos uma autêntica despersonalização: as luzes da cidade se embaralhavam nas pupilas, os corpos caminhavam inertes e, naquela mesa de bar, ao lado do Trianom, não se ouviu muito mais que umas baforadas de Marlboro. Fumar era lindo e fazia parte da experiência estética.

Muita gente diz que Charlie Kauffman ficou preso à própria fórmula a partir de então. Só não ficou mais preso do que a patota de imitadores que pipocam aos montes atrás dele, nem dos estudantes de audiovisual que cultuam, todos os dias, as mesmas imagens de Spike Jonze e Michel Gondry.

16) Encontros e Desencontros (Sofia Coppola, 2004)
What´s So Funny About Peace, Love & Understanding? Só de pensar que tem gente que ainda não entendeu Sofia Coppola, me dá um sono e tanto. E uma vontade enorme de pegar essa trilha sonora inteira e gastar em fichas num karaokê japonês.


17) O Segredo de Brokeback Mountain (Ang Lee, 2005)


18) A Pequena Miss Sunshine (Johnatan Dayton & Valerie Farriss, 2007)

19)
Persépolis (Vincent Paronnaud, Marjane Satrapi, 2007)

20) Michael Jackson´s This Is It (Kenny Ortega, 2009).
Eu vou votar nesse documentário musical meio epitáfio/meio making off por todos os motivos -- emotivos, políticos, musicais, históricos -- que já foram tão bem exemplificados tanto aqui quanto em tantas outras resenhas, que você já leu, tenho certeza. Se a década precisa ter um musical, esse é o musical.

E você? Quais são os seus pitacos?

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

The big rock & pop in 2010


No rock n´roll existe um consenso de que banda boa é banda média: nem tão obscura e ainda semi-profissional -- tocando pra 100 pessoas num inferninho qualquer --, nem grande a ponto de lotar estádios e se acomodar na fórmula consagradora, abusando de palcos gigantescos e turnês ambiciosas, milhas distante das ousadias e de qualquer experimentalismo que afaste as massas.

Por isso me admirei com o No Line On The Horizon, do U2, lançado em março desse ano. Pelo menos arejaram a sonoridade, ainda que com os mesmos ares de The Joshua Tree [1987] e Achtung Baby [1991], também produzidos por Brian Eno e Daniel Lanois. Mas ao contrário das guitarrinhas inofensivas e das melodias chorosas de All That You Can´t Leave Behind [2000] e How to Dismantle An Atomic Bomb [2004], No Line pelo menos convida o ouvinte a levantar a bunda do sofá e levar seus sentidos pra dar uma voltinha.

Quem não curtiu foi o público: o disco mal vendeu 1 milhão de cópias, segundo o The Guardian. Podem culpar a cauda longa da internet ou a crise econômica. Podem culpar o Michael Jackson que, depois de morto, roubou quase toda atenção do showbizz e vendeu 6 milhões de discos em 4 meses só com a coletânea Number Ones. Mas basta reparar no público dos shows da 360° Tour, ou mesmo das duas turnês anteriores, se você esteve em algum deles: quantos discos do U2 você acha que esse povo tem? E quais serão os preferidos desse público? Não devem ser Boy [1980], War[1983] ou Unforgetable Fire [1984].

Veja bem: o U2 toca em estádios há pelo menos 25 anos. Tem cara de banda grande. Sonoridade de banda grande. Atitude política de banda grande. Você imagina hinos como Pride ou Where The Streets Have No Name executados em caverninhas habitadas por gente triste, pseudo-intelectuais e alternativinhos de plantão? Como é que se pega uma canção cheia de camadas climáticas como The Unforgetable Fire e se toca em outro lugar que não seja um estádio, pra milhares de seres dispostos a encarar uma catarse coletiva e cantar pra vizinhança toda ouvir? Não entendo, portanto, a crítica à grandeza.

O Brian Eno entende. Em excelente entrevista publicada pelo Pitchfork, o mitaço foi logo quebrando alguns sensos comuns. "Eles [U2] já fizeram várias mudanças significantes em vários pontos da carreira. Eles são, na verdade, uma banda muito experimental, mas por causa da forma da música deles, muita gente não reconhece. Se fosse alguma banda indie obscura, as pessoas provavelmente pensariam: 'Deus, eles são demais! Continuam surgindo sempre com coisas novas!'. Mas porque venderam milhões de discos, os experimentos passam batidos' (...) E eles não são exatamente o tipo de banda que quer perder adeptos durante a caminhada".

Enquanto isso, na cultuada nuvem do Radiohead, Thom Yorke coça o nariz e todos dizem que é arte.

A dupla de grafiteiros osgemeos vai aos poucos se transformando num fenômeno pop Romero Brito [em breve canecas e reproduções na Tok & Stok]. Começa a contagem regressiva para que os alternativos procurem outra alternativa.

Voltando à Irlanda. Se o dilema do U2 é descobrir se vai 1) sentar a bunda 2) ousar e perder adeptos 3) descobrir como ousar sem espantar os aderentes da dieta pop-easy nesse novo e muito louco modelo de negócios da música, restará, de fato, saber pra onde vai o rock de massas num cenário cada vez mais segmentado.

Pelo menos com shows, que seguem lotados e muitíssimo bem produzidos, Bono & cia podem sossegar. Ou não. O que se vê, na 360° -- de forma ainda mais evidente após assistir ao This Is It de Michael Jackson -- é uma banda que faz um puta show, mas se acomoda no set-list , sob medida para o público de ATYCLB e HTDAAB, com músicos que se cansam por saracotear num palco monstruoso, enquanto tocam, cantam e interagem com o público.

Faz parte do conceito mega-pop. Mas me parece cruel para uma banda de rock. Mais cruel ainda para um fã de música, cercado por gente greatest hits, que prefere o telão. [É claro que eu também vejo o telão, mas péra lá]. Michael Jackson, nos ensaios de TII, não parecia menor que a infra-estrutura. Tudo bem que essa pergunta já foi feita outras vezes, mas pra onde é que o U2 vai depois de um palco giratório e uma garra gigante? Onde estará o U2 no meio da próxima parafernália?

A colunista Sônia Racy, do jornal O Estado de S. Paulo, confirmou essa semana 3 shows do u2 com a turnê 360°C em São Paulo e 1 no Rio de Janeiro, em novembro de 2010. Guarde grana e chegue cedo para garantir o seu lugar na fila. Vá com fé.

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Donna Madonna vem ao Brasil semana que vem prestigiar a terra de seu iluminado gigolô nazareno. Essa é outra que ficou escrava do padrão pop que criou. Mas o que a gente faz? O que se viu ano passado na etapa brasileira da Sticky & Sweet Tour foi estilo Madonna: cronometrado, bem feito, valendo a pena, mas sem um pingo de mágica. Se eu fosse ela, aos 51, daria um basta nas cadelas do telão e apostaria no minimalista: uma boa banda, com arranjos modernizados -- mais rústicos e menos plastificados -- e, acima de tudo, gogó. Será que a burocrata topa? Recorte a apresentação de Bad Girl ao vivo no Saturday Night Live back in the 90´s e cole na boa versão de Ray Of Light by Snow Patrol. Me diga o que acha.

Quero dizer, e só um chute. Um devaneio. Não custa imaginar.




domingo, 1 de novembro de 2009

The beautiful fade out


Foi um belo sábado de sol em São Paulo.

E você queria que eu fizesse o quê, uma resenhinha metida à besta sobre um filme da Mostra?

Eu assisti This Is It.
E no mundo de Michael Jackson, você abraça um amigo, escolhe uma poltrona, e viaja inquieto num poderoso mosaico artístico extra-sensório pelas câmeras distantes que o registravam como sempre foi: um corpo genial preenchendo os espaços vitais entre luz e sombra, estranheza e beleza, mágica e música.

Ponto para Kenny Ortega, que a partir de 100 horas de ensaios gravados para o acervo pessoal do cantor, dirigiu um documentário leve e honesto sobre a criação artística de um grande. O filme alterna depoimentos dos músicos, dançarinos e figurinistas do espetáculo com as performances de cada canção e a obsessão de Michael sobre cada detalhe: a nota, o passo, o efeito especial, a modernização dos arranjos -- "mais groove", ele pede --, a releitura dos vídeos clássicos. "It´s all for love: L.O.V.E."

Você nem precisa escolher. Pode passar 2 horas ao mesmo tempo rindo, cantando, dançando na poltrona, imitando o som do baixo com a boca, fazendo air guitar para os fenomenais Tommy Organ e Orianthi Panagaris, deixando o corpo tremer com o groove -- "quero mais funk" -- do baixista que obedece, batendo palmas, estalando os dedos e repetindo "puta que o pariu!, puta que o pariu!".

Bom também para se conhecer melhor. Que raio de mulher eu sou, afinal? Uma pessoa que chora aos primeiros sinais de Wanna Be Startin Something não vai aguentar 5 minutos de um trabalho de parto nessa vida.

Tem Human Nature, a dona da bola, num excelente trabalho vocal. Tem Michael se divertindo numa grua que passeia sobre o auditório. Tem vídeo de Thriller repaginado brilhantemente alá Tim Burton, e toda a graça de MJ versão gânsgter contracenando com Rita Hayworth em Gilda; direto do caldeirão das referências pops: the kitch is beautiful. Uma aranha lúdica invade o palco antes que as telas mostrem um vídeo sobre a devastação ambiental para Earth Song. E eu que achava que Earth Song parecia com abertura de olimpíada. [O Kenny Ortega já dirigiu uma].

É o fim das criancinhas em cima do palco de mãozinhas dadas e o começo das dançarinas semi-nuas fazendo pole dancing! Novos arranjos e uma bela negona a temperar a cena The Way You Make Me Feel. Tem um bloco Jackson 5 com direito a Shake Your Body, há quanto tempo! Tem uma contralto japonesa dando vida ao belo dueto I Just Can´t Stop Loving You.

Fãs vestidos a caráter, adolescentes descobridores, casais de meia idade, curiosos filhos de Deus: o cinema todo aplaude, como se estivesse no Staples Center.

E pouca coisa é tão bonita quanto um Michael Jackson, aos 50, levar ofegante, até o fim, sua performance apaixonada de Billie Jean, cheio de fúria, e dizer assim: "acho que deu pra sentir". Depois um longo fade out.

O cinema em silêncio.

E os olhinhos todos, como pequenos faróis, vidram-se na tela quando ele, nos ensaios, aponta um público imaginário e diz: "electric eyes are everywhere".

Esse mundo é cheio de gente anódina, vivendo de canapés e pose, que mal sente o sangue esquentar e sequer enxerga o mundo de olhos fechados, ouvindo música.

Em This Is It, quando você fechar os olhos, enxergará Michael Jackson dono de si.