domingo, 9 de outubro de 2016

O parklet Jaçanã-Tremembé

Estou impedida de treinar há 2 meses devido a um problema na coluna, mas ontem e hoje resolvi me rebelar e retomar o velho hábito de caminhar por 5 Km ao redor de uma praça onde, nesta primavera que finalmente deu as caras, ipês amarelos e rosas florescem e trazem com eles todo um espírito de passado e de interior no extremo norte desta dura capital Non Dvcor, Dvcor.

Estavam lá duas famílias inteiras sentadas vendo a vida passar, uma velhinha de bengala arriscando passos heroicos com a filha já na meia idade, pássaros cantantes, trabalhadores braçais do Hospital São Luiz Gonzaga se exercitando com seus uniformes nos aparelhos públicos, crianças cheias de energia e um menino de aparentes 7 anos, que quase atropelei com minhas passadas largas, amontoando pedrinhas no chão e ameaçando um inimigo imaginário: "é a guerra! vai começar a guerra!"

Completam a vida local o pipoqueiro de colarinho azul, a perua kombi que vende lanches, a vendedora de cocadas, o vendedor de laranjas, as laranjas empilhadas em sacos por aproximadamente 50 metros na rua de lazer, uma saxofonista de semáforo desfilando um repertório que ia de Alceu Valença a "Garota de Ipanema" e "Primavera" de Tim Maia.

Os sobrados ao redor formam um mosaico de cores aleatórias. São lotes paulistas, um tipo de arquitetura para as massas que tende a desaparecer conforme a especulação imobiliária das varandas gourmets captura o gosto das novas massas, embora por aqui algumas tendências tardem e falhem. A igreja onde fui batizada e fiz minha primeira comunhão está pintada de amarelo e, pelo que me consta, abriga um desses padres jovens e carismáticos.

Bem em frente há um parklet da prefeitura, muito limpo, muito conservado, com uma placa que explica o que é um parklet, pra que servem parklets, quais as vantagens dos parklets e que diz que aquele parklet se chama Jaçanã-Tremembé. Talvez seja o único parklet entre os vários quilômetros que agregam esses dois distritos e a subprefeitura em questão. Não sei e nunca contei. Passei 5 minutos sentada e percebi que ali, no fundo da paróquia, ainda existe o salão onde um professor de música da minha infância me ensinou a tocar e cantar uma música do Chico Buarque chamada "Passaredo", que se tornou uma espécie de Pai Nosso, uma lembrança automática e que nunca mais esqueci.

Aquela São Paulo dos cosmopolitas, dos gestores, dos modernos, dos militantes, dos cultos, dos super ocupados nos ignora completamente e talvez, por isso mesmo, ainda estejamos salvos por aqui.

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