terça-feira, 24 de novembro de 2015

Each man kills the thing he loves

Quando li pela primeira vez o trecho da "Balada do Cárcere de Reading" de Oscar Wilde em sua máxima "each man kills the thing he loves", eu tinha 19 anos, cursava Relações Públicas na Cásper Líbero e estava no auge do meu primeiro estágio, que consistia no cárcere da recepção bilingue de uma multinacional sem visitantes, sem internet e antes do Facebook, diante de um PABX e das imagens do circuito fechado de TV com vista para uma padaria-muquifo no baixo Pinheiros, pré-gentrificação. 

Para além do fato de dormir mal, demorar 2 horas pra cruzar São Paulo de ônibus com todo tipo de estudante -- os legais, os estranhos e os psicopatas -- dentro do finado 701-U Butantã-USP, fui o melhor aproveitamento da sala em Antropologia (o que não serviu de nada nem a mim, nem a Malinowski). Eu era uma autêntica porralouca e party girl nas horas vagas e não gostava de ninguém. Estava numa espécie de intervalo dos afetos, voltada aos novos amigos, livre como um táxi rodando pela cidade, sem qualquer paixão ou fantasia romântica, em plena fase de experimentação. 

Diante de todas essas circunstâncias, minha passagem relâmpago pelo mundo corporativo incluiu todo tipo de merda acidental. A maior delas foi quando derrubei o enorme balcão de vidro da recepção no chão e acabei com o dia de trabalho na firma num dia de quadril quente e problemas de propriocepção. Não durei três meses naquele mundo de calças sociais em cores neutras, mas passei muito tempo condicionada a catar tudo o que brilhava do chão, inclusive todo tipo de caco e de objetos cortantes. Conforme meus reais talentos vieram à tona, fui me aperfeiçoando também em amar e matar. "Some do the deed with so many tears, and some without a sigh". 

Na década passada, fui e voltei de Oscar Wilde a cada dois anos e cheguei até mesmo a presenciar um milagre da ressurreição de Lázaro, a quem tive que amar e matar novamente nas versões carne e osso, sonho, pesadelo e espírito obsessor. Uma vida de energia e de cura pelas mãos. Hands of lust & hands of gold.

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