domingo, 4 de abril de 2010

Easter Eggs musicais

Esse povo anódino & triste -- gente que não se diverte --, nunca vai saber o que é devorar 3 porções de Delícias Portuguesas e Surpresas da Dona Idalina e, depois de muita cerveja com tequila, performar a coreografia do Bonde do Tigrão na companhia de duas advogadas quase balzaquianas para uma turista armena de olhos devidamente arregalados. Aconteceu na madrugada da Sexta-Feira Santa, no banheiro feminino do Bar do Luiz Fernandes, na zona norte de São Paulo. Mas essa gente anódina sequer conhece a zona norte de São Paulo.

O capítulo seguinte chama-se ressaca. Olha, cara, fazia um bom tempo desde a minha última ressaca. A rigor, estou bebendo melhor e bem menos. Como melhor mas não necessariamente menos. Ouço música melhor, na mesma quantidade e com a mesma intensidade de sempre, apenas mais contemplativa (afinal de contas, não dá pra fingir ou crer que a gente vá virar uma Janis Joplin ou uma Patti Smith a esta altura do campeonato). Tenho muito menos preconceitos estéticos importados da modernice babaca da vez. Leio muito menos resenhas musicais do que antes. É como se eu não precisasse mais de pretensos críticos de nada, o que não elimina meu gosto pela lenha na fogueira sobre qualquer assunto. Deve ser amadurecimento. Ou apenas o botão do foda-se, cada vez mais proeminente aqui no meio da minha testa. Viu?

Choveu. Esfriou. E no feriado cirstão, guardei algum tempo para baixar e ouvir coisas velhas que são novas pra mim, ou coisas novas de gente quase velha, que me fazem tanto bem, quase sempre. Coisa que não tem nada a ver com nada e tudo a ver com tudo. Quer saber os porquês? Quer apenas anotar umas dicas de meia tigela? Aí vão:

Massive Attack - "Heligoland"
Não tem catarse, sabe? Mas é bom. É refinado. Melancólico e noturno. Você vai fazer uma boa presença com seus amigos gays, que voltaram agora de Londres, caso os receba para jantar com essa trilha sonora. Fazia 7 anos que o Massive Attack não dava as caras. Sentimos falta. Tem a participação das excelentes Martina Topley-Bird e Hope Sandoval, que já haviam colaborado com Tricky em discos solos, nas hipnóticas Babel, Psyche e Paradise Circus. É tudo tão lento, tão conceitual. Mas quase nada abstrato. Não tem a força uterina de um Mezzanine [progenitor desse Heligoland] ou de um Blue Lines -- verdadeiras obras-primas dos ingleses -- mas tem dignidade, coesão; acerta o alvo. A faixa mais pop talvez seja a de abertura, a bela Pray For The Rain, com participação de Tunde Adepimpe. Cai bem com champanhe. Faça um teste e me diga.


Itamar Assumpção & Banda Isca de Polícia - "Beleléu, Leléu, Éu"
O que eu queria mesmo era o tal do especial da TV Cultura, em DVD, gravado em 1983 no auge do Lira Paulistana. "Eu não tô mais afim de curtir a tua, e nem de ficar tomando na cara!" Não achei. Suzana Salles genial, Virginia Rosa brilhante, baita bandaça! Hey você, fã da vanguarda Marcelo Camelo & Mallu Magalhães: pega no meu beleléu, leléu, éu e balança! "Entreguei meu sangue e o meu plasma, plasma, plasma, plasma". Muito carinho, Itamar.


Brian Wilson - "Smile"
Nunca fui muito ligada em Beach Boys, simplesmente porque achava aquilo tudo muito certinho, muito apolíneo, muito Beatles e pouco Rolling Stones pro meu gosto. Mas além do Pet Sounds, que é bonito demais acima de tudo, tive contato tardio com Smile, o projeto que os anos loucos afastaram de Brian, até que Brian afastasse de vez seus fantasmas e encarasse de frente essa parada harmonicamente genial, tão cheia de lirismo e cores. Tanta coisa feita pra se ouvir de joelhos: Child is The Father Of The Man e Surf´s Up entre elas.

George Harrison - "Let It Roll - The Best Of George Harrison"
Pra não dizer que não falei de um beatle, ataquei logo com essa coletânea lançada recentemente pela viúva do pisciano da turma. Não chega perto de um "spiritual game", mas tem acordes primorosos de guitarra, tudo muito bem arranjado, e com doses bem menores da chamada assepsia Paul McCartney. George é nosso hare-kirshna, and still his guitar gently weeps nas pequenas belezas de Ballad Of Sir Frankie Crips, Marwa Blues e My Sweet Lord. De como transformar um domingo morto numa imensa alegria, capítulo inicial.


Marlena Shaw - "Anthology"
Hey você, que acha que Beyouncé faz "música negra" e canta pra caramba: toma essa! Hey você, que adora dizer que é fã de Nina Simone (só pra pagar de culto na rodinha): tome mais uma também! Podemos conversar daqui a 10 dias? Vá esquentando com Loving You Was Like a Party ou Feel Like Making Love e Liberation Conversation, foxy. Solte essa cintura. Te aguardo, gato.


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